Entender a Infeção Urinária
- Marta Temporão
- 29 de mar. de 2018
- 5 min de leitura
A infeção do trato urinário (ITU) corresponde à inflamação do epitélio da bexiga e/ ou rim geralmente decorrente da invasão e multiplicação de microrganismos, quer tenham origem bacteriana, viral ou fúngica (Matos, 2012).
Pela mesma, sabe-se que o trato urinário é estéril, à exceção da extremidade distal da uretra. O que sucede é que as bactérias do trato intestinal e da região perineal colonizam com facilidade o meato uretral e ascendem através do trato urinário causando infeção. A infeção urinária é mais prevalente em mulheres, por razões anatómicas e fisiológicas, mas também sucede em idosos, homens e crianças.
Quanto à sua localização pode ser classificada em ITU baixa - cistite, e ITU alta - pielonefrite. Nas cistites a inflamação está localizada no uroepitélio da bexiga, raramente tem complicações a longo prazo. No caso das ITU altas, a inflamação estende-se aos ureteres, à pélvis, ao parênquima renal, o que pode originar lesões permanentes e a longo prazo (como seja, insuficiência renal) (Eusébio et al., 2016; Matos, 2012).
Quanto à presença de fatores de risco, pode ser ou não complicada. As não complicadas ocorrer num trato urinário anatómico e funcionalmente normal, cujo hospedeiro é saudável. As ITU complicadas dão-se num sistema urinário com anomalias estruturais ou funcionais, numa pessoa imunodeprimida, em que os seus agentes patogénicos são de elevada virulência (Eusébio, et al., 2016; Matos, 2012).
Quanto à relação com outras infeções urinárias pode-se classificar como sendo ITU primária ou recorrente. Esta última é caracterizada pela existência de dois ou mais episódios de infeção urinária sintomática no período de seis meses. No caso das crianças, a Associação Europeia de Urologia subclassifica a ITU recorrente em infeção não resolvida, persistência bacteriana e re-infeção (Matos, 2012).
É causada maioritariamente por microrganismos provenientes da flora comensal intestinal ou genital, colonizando ascendentemente. Mais frequentemente, os agentes patogénicos são a Escherichia Coli, o Staphilococcus saprophyticus, espécies de Proteus e de Klebsiella e o Enterococcus faecalis (Eusébio, et al. 2016; Matos, 2012).
A presença de infeção, assim como a sua extensão, depende da interação entre fatores de virulência do microrganismo, defesas do hospedeiro e o tamanho do inóculo (Eusébio, et al., 2016; Matos, 2012).
Os sintomas e sinais associados à ITU são a poliúria (vontade de urinar recorrente, sem aumento de volume da urina), urgência miccional, disúria (dor ao urinar), hematúria (presença de sangue na urina) e piúria (presença de glóbulos brancos na urina, em resposta à inflamação do urotélio).
O trato urinário possui os seus próprios mecanismos de defesa, nomeadamente, pela flora comensal da vagina, da região peri-uretral e da uretra cujos formam uma barreira protetora contra a colonização por agente uropatogénicos. Porém, alterações do pH, dos valores de estrogénios e o uso de antibióticos, favorece a colonização por outros microrganismos. A urina é outra forma de inibir o crescimento bacteriano. Formas de inibir este meio protetor tem que ver com a concentração de ureia, de ácidos e de pH. A presença de glicose na urina favorece o crescimento bacteriano. Parece que a glicoproteína de Tamm-Horsfall tem efeito protetor. Esta glicoproteína é a proteína mais abundante na urina sendo apenas encontrada no córtex e na medula renal. É produzida unicamente por células renais, e pela forma como atua, parece facilitar a remoção de bactérias uropatogénicas (Matos, 2012).
São fatores de risco:
• Obstrução do trato urinário - restrição do fluxo de urina da pélvis renal para o úreter proximal, sendo o principal fator para a dilatação dos rins;
• Presença de cateter urinário;
• Gravidez, pois a prevalência de bacteriúrica assintomática é cerca de 10% na gravidez, em que no 3º trimestre, 25 a 57% destas evoluem para infeção sintomática
• Diabetes Mellitus;
• Prostatismo - aumento do volume da próstata pode causar obstrução ao fluxo urinário;
• Menopausa - a falta de estrogénio diminui o efeito protetor que têm;
• Transplante renal - pela imunossupressão e pelo próprio ambiente hospitalar;
• Eliminação disfuncional da urina - por micções frequentes, urgência, incontinência urinária, manobras de retenção;
• Alterações genéticas - demonstrou-se que a presença de CXCR1 (recetor interleucina 8) está reduzida em indivíduos com maior prevalência de pielonefrite em idade pediátrica (Matos, 2012).
Como há diferentes agentes patogénicos, diferentes hospedeiros e a apresentação da infeção varia de pessoa para pessoa, a escolha da terapia antimicrobiana varia de acordo com estes fatores. Estudos referem que a infeção urinária é responsável pelo internamento de elevado número de pessoas, dado importante, pois os sinais de uma ITU não complicada podem ser identificados precocemente (Eusébio, et al., 2016; Matos, 2012; Oliveira, 2015).
O estabelecimento de critérios de diagnóstico é deveras importante, pois o tratamento deve ser iniciado o mais precoce possível. Este diagnóstico resulta da conjugação de manifestações clínicas sugestivas com uma análise de urina com fita teste positiva (considera-se positiva se o parâmetro da enzima esterase leucocitária (EL) ou nitritos for positivo) e uma análise citoquímica de urina positiva (se demonstrar leucocitúria e presença de nitritos; leucocitúria com bacteriúria; bacteriúria isolada ou presença isolada de nitritos).
Perante isto, inicia-se antibioterapia empírica, pois, o diagnóstico provável dará lugar a um diagnóstico definitivo aquando do conhecimento do exame cultural da urina (Matos, 2012).
Nos últimos anos a investigação farmacêutica tem-se desenvolvido e com isso criado novos antimicrobianos. Porém com o surgimento de agente microbianos mais potentes e mais resistentes, as medidas preventivas assumem um papel fundamental.
Embora o diagnóstico seja médico, cabe ao enfermeiro contribuir para a prevenção, começando pelos fatores de risco e cuidados preventivos.
Estes cuidados passam por:
• Higienização corporal adequada, principalmente nos casos do género feminino;
• Adoção de cuidados essenciais, por exemplo cuidados na vida sexual, nomeadamente realizar o esvaziamento vesical após o ato sexual, utilizar com prudência e se possível evitar o uso de espermicida e diafragma ou substituir por outros métodos contraceptivos;
• Realizar higiene pessoal de forma correta após a evacuação e micção;
• Evitar duches vaginais
• Ingerir bastantes líquidos, quer como forma de prevenção, quer como forma de tratamento, sendo que não se deve reter a urina.
É importante adotar comportamentos que contribuem para prevenir ITU, como sejam os cuidados asséticos a ter na cateterização vesical quer pelos cuidados a ter na presença de doentes imunodeprimidos. É crucial estar atento aos sinais e sintomas referidos pelos clientes (Oliveira, 2015; Reis et al., 2017).
Eusébio, A.; Araújo, C.; Andrade, M.; Duarte, A. (2016). Escherichia coli nas infec¸ões urinárias da comunidade: comensal ou patogénica? Acta Urológica Portuguesa, 33(2), 37-42. https://doi.org/10.1016/j.acup.2016.02.002
Matos, A. (2012). Patogénese da Infeção Urinária. (Master’s thesis, Universidade Fernando Pessoa Porto). Retrieved from https://bdigital.ufp.pt/bitstream/10284/3567/3/T_AnaMatos.pdf
Oliveira, V. (2015). A Prevenção da Infeção Urinária na Pessoa Idosa como Intervenção de Enfermagem (Master’s Thesis, Escola Superior de Enfermagem de Lisboa). Retrieved from http://hdl.handle.net/10400.26/16401
Reis, A.; Vasconcelos, J.; Santos, L; Silva, L.; Aredes, L.; Nantes, M.; Cesar, J. (2017). Escherichia coli na infecção do trato urinário em mulheres. Brazilian Journal of Surgery and Clinical Research, 20(1), 122-127. Retrieved from http://eds.b.ebscohost.com/eds/pdfviewer/pdfviewer?vid=2&sid=3db31785-7b49-4663-89af-9074b1b867d9%40sessionmgr103

Esquema representativo do sistema urinário (Berkow, 2002, retrieved from Matos, 2012)
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